O processo foi instaurado pela Superintendência de Registro de Valores Mobiliários da Comissão de Valores Mobiliários (“SRE” e “CVM“, respectivamente) com o objetivo de apurar suposta oferta irregular de valores mobiliários de um determinado token pela empresa tokenizadora em sua página na internet.
Os tokens ofertados representavam frações ideais de futuros apartamentos, ainda em fase de construção, pertencentes a um empreendimento residencial. Ainda, a empresa tokenizadora deveria ser nomeada pelos compradores dos tokens, por meio de contrato específico, como sua comissária exclusiva para realizar a venda das frações ideais posteriormente à sua construção e incorporação. De acordo com o arranjo contratual estabelecido, apenas no caso de insucesso em referidas vendas é que os compradores poderiam resgatar os tokens e receber efetivamente a propriedade das frações ideais adquiridas.
Ao analisar os fatos, a área técnica entendeu que o intuito do comprador não era residir nos apartamentos ou mesmo vender a sua fração por contra própria, mas obter ganho de capital a partir dos esforços de venda a serem realizados pela tokenizadora.
Segundo a SRE, tal estrutura não se caracterizaria como venda de frações ideais imobiliárias, possuindo a natureza de contrato de investimento, tendo em vista que: (i) os investidores aportariam recursos para obter ganhos financeiros; (ii) o investimento era formalizado por meio de contratos; (iii) haveria investimento coletivo, pois a empresa tokenizadora realizaria a venda das frações ideais; (iv) haveria remuneração originada dos esforços de venda da tokenizadora; e (v) haveria publicidade, na medida em que o produto teria sido oferecido ao público em geral em página da internet.
A empresa tokenizadora alegou, em resumo, que o token não poderia ser considerado valor mobiliário, pois: (i) não haveria necessariamente um investimento financeiro, tendo em vista a possibilidade de resgate do token em fração imobiliária pelo comprador (tal como ocorreria na aquisição de imóveis pelas vias “tradicionais”); (ii) não haveria relação de parceria ou de associação entre a empresa tokenizadora e a empresa incorporadora dos imóveis, mas apenas serviços de corretagem; (iii) os compradores dos tokens não teriam direito de participação, parceria ou remuneração (pelo contrário, remunerariam a tokenizadora pelos serviços de comissão prestados para venda dos imóveis); e (iv) os tokens não gerariam rendimento financeiro, uma vez que a única possível vantagem financeira seria o ganho de capital advindo de eventual compra e revenda dos imóveis, a qual seria futura e incerta, além de depender exclusivamente de fatores externos.
Não obstante, o Colegiado da CVM acompanhou o entendimento da SRE e deliberou, por unanimidade, pela edição da Deliberação CVM nº 881, por meio da qual foi determinada a suspensão imediata da oferta irregular dos tokens, sob pena de multa diária no valor de R$100.000,00.
A Deliberação CVM nº 881 foi publicada em 12.04.22 e sua íntegra pode ser acessada aqui, bem como as respectivas Ata da Reunião do Colegiado e Notícia publicadas no site da CVM.