Em que pese a diferença de regime jurídico e de funções das áreas de preservação permanente e das faixas não edificáveis – as primeiras, limitações administrativas relacionadas à proteção de recursos ambientais e as segundas, servidões administrativas de natureza urbanística, na prática, há muita controvérsia entre a existência e a extensão das faixas marginais de recursos hídricos nas áreas urbanizadas.
O art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (Código Florestal) determina que as faixas marginais no entorno de qualquer curso d’água natural são consideradas áreas de preservação permanente – APP, ainda que localizadas em área urbana. Nestes casos, deverão ser mantidas preservadas áreas de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, dependendo da largura do corpo hídrico que se visa proteger. A intervenção ou supressão de vegetação nativa nestas áreas será autorizada somente nas hipóteses de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental.
Por sua vez, o art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1979 (Lei de Parcelamento do Solo Urbano) estipula em 15 (quinze) metros a reserva de faixa não edificável ao longo das águas correntes e dormentes situadas em áreas urbanas.
Diante da controvérsia envolvendo as metragens a serem preservadas nas áreas urbanas, nas ações tidas como leading case, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina determinou a aplicação da Lei de Parcelamento de Solo Urbano para as áreas urbanas consolidadas, nos casos em que o imóvel já se encontra edificado e a APP avariada, sob a justificativa de que o direito de propriedade deveria prevalecer.
Contra esse posicionamento, o Ministério Público Estadual interpôs recursos especiais alegando, em síntese, a negativa de vigência ao Código Florestal. Em 30.04.2019, o Superior Tribunal de Justiça afetou os recursos ao rito dos recursos repetitivos já que representativos da controvérsia (Tema 1.010).
A Procuradoria-Geral da República emitiu parecer pelo provimento dos referidos recursos, entendendo que “a legislação ambiental guardaria aplicação, mesmo nas áreas urbanas, bem assim de que a Teoria do Fato Consumado não justificaria a inobservância da regra de proteção ao meio ambiente”.
Nesta quarta-feira (28.04.2021), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento de que, na vigência do Código Florestal de 2012, a APP em trechos caracterizado como área urbana consolidada deverá cumprir o determinado no art. 4º, inciso I do Código Florestal, a fim de se garantir a mais ampla proteção ao meio ambiente. Na sessão de julgamento, entendeu-se que não haveria razão para tratar de forma diferente os cursos d’água nas zonas urbanas. À unanimidade, os ministros entenderam pela inaplicabilidade da modulação de efeitos da decisão.
As equipes de Direito Ambiental e de Direito Imobiliário do Cescon Barrieu estão à disposição para eventuais esclarecimentos sobre o tema.