O Projeto de Lei nº 2.628/2022, conhecido como “ECA Digital”, foi aprovado pelo Congresso Nacional e segue para sanção presidencial, impulsionado por uma crescente preocupação social com a “adultização” de crianças nas redes sociais. A proposta cria um marco regulatório para a proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital, aplicável a todos os produtos e serviços de tecnologia disponíveis no Brasil.
O texto concretiza a aplicação dos princípios da proteção integral, prevalência dos interesses da criança, segurança contra abusos, proteção contra exploração comercial indevida e respeito à autonomia progressiva no âmbito digital, bem como prevê a alteração da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) de forma a reforçar um tratamento de dados de crianças e adolescentes mais alinhado ao seu melhor interesse. Entre as principais medidas, prevê:
- Adoção de configurações padrão mais protetivas para privacidade e proteção de dados pessoais, em conformidade com os conceitos de privacy by design e privacy by default;
- Disponibilização de mecanismos de controle parental simples e eficazes;
- Proibição de acesso de crianças a redes sociais, devendo haver verificação confiável de idade, proibida a simples autodeclaração;
- Manutenção de mecanismos acessíveis de denúncia;
- Proibição de publicidade direcionada a crianças, uso de técnicas de perfilamento e “loot boxes” (“caixas de recompensa”) em jogos eletrônicos;
- Obrigação de relatórios semestrais de transparência por plataformas com mais de 1 milhão de usuários menores;
- Atuação conjunta da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (“ANPD”), Ministério da Justiça e CONANDA na definição de boas práticas.
Quanto aos mecanismos de verificação de idade, embora o projeto não especifique detalhadamente as tecnologias a serem utilizadas, o contexto regulatório internacional aponta para algumas soluções mais robustas, que incluem: (i) verificação por documentos oficiais, (ii) reconhecimento facial por inteligência artificial para identificação da possível idade, (iii) verificação cruzada com bancos de dados terceirizados, registros governamentais ou históricos educacionais; (iv) provas de conhecimento zero (zero-knowledge proofs) voltadas a provar que o usuário possui mais de 18 anos; (v) Blueprint Europeu, sistema projetado pela Comissão Europeia, sendo a primeira implementação de um modelo preservador de privacidade, para que o usuário comprove sua idade uma única vez junto à autoridade confiável e, a partir disso, ele poderá demonstrar que cumpre um critério etário em diferentes plataformas sem revelar dados pessoais adicionais.
No campo da privacidade e da proteção de dados, o Eca Digital estabelece um conjunto relevante de medidas a serem observadas pelas empresas, atribuindo à ANPD um papel de destaque no âmbito regulatório. Dentre as disposições de proteção de dados, destacam-se: (a) a alteração do artigo 14 da LGPD para ampliar as hipóteses de tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes (visando o princípio do melhor interesse); (b) a obrigatoriedade de elaboração de relatórios de impacto sempre que a atividade de tratamento envolver esse público; (c) a proibição do uso de perfilamento para fins de publicidade e propaganda, bem como da aplicação de técnicas de análise emocional e de realidade virtual; e (d) a exigência de que as plataformas de redes sociais adotem regras específicas para o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes.
Ainda, o Projeto de Lei estabelece a responsabilidade das plataformas pela manutenção de conteúdos que violem direitos de crianças e adolescentes, a partir do momento em que sejam notificadas acerca de seu caráter ofensivo. Nesse aspecto, o ECA Digital complementa o Marco Civil da Internet, introduzindo uma exceção adicional à regra geral de exigência de ordem judicial para a remoção de conteúdo.
As penalidades por descumprimento, previstas no Projeto de Lei, incluem advertência, multas de até 10% do faturamento ou R$ 50 milhões por infração, suspensão temporária ou proibição definitiva das atividades.
Com essa aprovação, o Brasil dá um passo decisivo para alinhar-se às tendências regulatórias internacionais de proteção digital da infância, construindo, a nível regulatório, um ambiente digital mais seguro, transparente e responsável para o desenvolvimento de crianças e adolescentes.
Nossos times de Planejamento Patrimonial e Sucessório | Família e Sucessões e Inovação & Tecnologia estão à disposição para auxiliá-los em temas relacionados ao ECA Digital.