Novas resoluções do Banco Central sobre ativos virtuais

No dia 10 de novembro de 2025, o Banco Central do Brasil (“BCB”) publicou as Resoluções BCB nº 519, 520 e 521 (em conjunto, as “Novas Regras”), que disciplinam: (i) a atividade de prestação de serviços de ativos virtuais no Brasil; (ii) o processo de autorização para prestar serviços de ativos virtuais no Brasil; (iii) o uso de ativos virtuais no mercado de câmbio brasileiro; e (iv) o uso de ativos virtuais nas operações de capitais internacionais.

Abaixo, trazemos um resumo dos principais pontos constantes da nova regulamentação.

I. Conceito de ativo virtual

    A legislação brasileira1 reconhece como ativo virtual a “representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para realização de pagamentos ou com propósito de investimento”. Estão expressamente excluídos desta definição: (i) a moeda nacional e moedas estrangeiras; (ii) a moeda eletrônica, nos termos da legislação específica; (iii) instrumentos que provejam ao seu titular acesso a produtos ou serviços especificados ou a benefício proveniente desses produtos ou serviços, a exemplo de pontos e recompensas de programas de fidelidade; e (iv) representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação esteja prevista em lei ou regulamento, a exemplo de valores mobiliários e de ativos financeiros.

    II. SPSAV: conceito e modalidades

      As Novas Regras introduzem o conceito de sociedade prestadora de serviços de ativos virtuais (“SPSAV”), a qual configura uma sociedade que, mediante autorização do BCB, poderá atuar na prestação de serviços sob três modalidades:

      ModalidadeDescrição das atividades
      IntermediáriaExclusivamente, por conta de terceiros, de forma individual ou cumulativa: (i) subscrever, isoladamente ou em consórcio com outras sociedades autorizadas, emissões de ativos virtuais; (ii) comprar, vender e trocar ativos virtuais; (iii) administrar carteiras de ativos virtuais ou carteiras compostas por ativos virtuais, valores mobiliários, ativos financeiros e outros instrumentos financeiros admitidos na regulamentação específica; (iv) exercer funções de agente fiduciário nas operações do mercado de ativos virtuais; (v) realizar operações de staking de ativos virtuais; (vi) praticar operações de prestação de serviços de ativos virtuais no mercado de câmbio; e (vii) exercer outras atividades expressamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil.2
      CustodianteExclusivamente, de forma individual ou cumulativa: (i) a guarda e o controle dos instrumentos que afetam o exercício dos direitos e benefícios relacionados ao ativo virtual, a exemplo das chaves privadas; (ii) a descrição, tempestivamente atualizada, da posição do ativo virtual, de cada tipo de ativo do cliente ou usuário do contrato de custódia, bem como a conciliação tempestiva dessa posição com as informações pertinentes disponíveis nos sistemas baseados nas tecnologias de registros distribuídos ou similar; (iii) o atendimento das instruções de movimentação emitidas pelo titular do ativo virtual ou da pessoa ao qual foi delegado o poder de agir no interesse do titular, bem como a conservação dessas instruções; (iv) o tratamento dos eventos incidentes sobre o ativo virtual; e (v) constituir e extinguir ônus e gravames;e (vi) a administração de dados e de informações relevantes ao exercício de alguma das atividades descritas nos itens “i” a “iv” a respeito do titular e dos seus ativos virtuais custodiados.
      CorretoraCumulativamente, as atividades de intermediação e a custódia de ativos virtuais.

      Além das SPSAVs, o BCB pode autorizar a atuação, nas modalidades de intermediárias e custodiantes, das seguintes instituições: (i) banco comercial, banco de investimento, banco múltiplo e a Caixa Econômica Federal; e (ii) sociedade corretora de títulos e valores mobiliários (“CTVM”), sociedade distribuidora de títulos e valores mobiliários (“DTVM”) e sociedade corretora de câmbio (“SCC”).

      III. SPSAV: principais regras e obrigações

        As principais regras e obrigações exigidas das SPSAVs estão resumidas abaixo:

        ConstituiçãoSPSAVs podem ser constituídas sob a forma de sociedade empresária limitada ou anônima;

        SPSAVs devem ser constituídas no Brasil e possuir sede e administração localizadas em território nacional e submetidas ao ordenamento jurídico e às autoridades do Brasil; e

        É vedada a constituição de uma SPSAV na qual figure pessoa natural como sócio único.  
        DenominaçãoAs SPSAVs:

        – Devem fazer constar, em seu nome empresarial, a expressão “Sociedade Prestadora de Serviços de Ativos Virtuais”; e

        – Não podem utilizar nomes empresariais que confundam os clientes e os usuários de seus serviços quanto à sua modalidade de atuação, ou que incluam termo ou fragmento de termo relacionado com atividade não autorizada ou que sugiram tal atividade, em português ou em língua estrangeira.  
        Capital MínimoSPSAVs deverão obedecer às regras referentes a limite mínimo de capital social integralizado e de patrimônio líquido constantes da regulamentação aplicável.3
        GovernançaAs SPSAVs devem conter, no mínimo, três diretores ou administradores responsáveis perante o BCB pelo cumprimento da regulamentação aplicável.
        Demais normasAs SPSAVs devem adotar regras e controles relacionados a diversos temas, incluindo:

        i. segregação de recursos financeiros e ativos virtuais;4

        ii. segurança cibernética;

        iii. controles internos, gerenciamento de riscos e prevenção e combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa (PLDFTP); e

        iv. avaliação de perfil de risco dos clientes.  

        IV. SPSAV: processos de autorização

          Em linhas gerais, o BCB analisará no âmbito dos processos de autorização de funcionamento das SPSAVs os mesmos requisitos atualmente exigidos de CTVMs, DTVMs e SCCs, conforme resumidos abaixo:

          Além do funcionamento da SPSAV, também dependem de autorização do BCB: (i) a mudança de modalidade de atuação; (ii) a transferência ou alteração de controle societário; (iii) a fusão, cisão ou incorporação da SPSAV; (iv) transformação societária; (v) a posse e o exercício de eleitos ou nomeados para cargos de administração; (vi) a alteração do valor do capital social; (vii) mudança da denominação social; e (viii) a mudança de objeto social para outro tipo de instituição dentre CTVM, DTVM e SCC.

          V. Uso de ativos virtuais no mercado de câmbio brasileiro

          Com as Novas Regras, passa a estar incluída no mercado de câmbio a prestação de serviços de ativos virtuais que compreenda as seguintes atividades ou operações:

          1. pagamento ou transferência internacional com ativos virtuais;
          2. transferência de ativo virtual de ou para cliente de prestador de serviços de ativos virtuais para cumprimento de obrigação decorrente do uso internacional de cartão ou de outro meio de pagamento eletrônico;
          3. transferência de ativo virtual de ou para carteira autocustodiada que não envolva pagamento ou transferência internacional com ativos virtuais; e
          4. compra, venda ou troca de ativos virtuais referenciados em moeda fiduciária.

          Além disso, as SPSAVs poderão ser autorizadas pelo BCB a realizar as operações acima indicadas (vedadas operações envolvendo moedas em espécie, nacional ou estrangeira), observado que o pagamento ou transferência internacional com ativos virtuais quando a contraparte não for instituição autorizada a operar no mercado de câmbio é limitado a US$ 100 mil.

          VI. Uso de ativos virtuais em operações de capitais internacionais

          As Novas Regras também passam a admitir expressamente o uso de ativos virtuais em operações de investimento estrangeiro direto e crédito externo, bem como capitais brasileiros no exterior.

          Por exemplo, é expressamente admitida a integralização de capital em ativos virtuais, assim como a realização de pagamentos de operações de crédito externo com o uso de tais ativos.

          VII. Vigência e período de transição

          De um modo geral, as principais alterações trazidas pelas Novas Regras entram em vigor no dia 2 de fevereiro de 2026 (“Data de Início de Vigência”).

          As sociedades que tiverem iniciado, de forma comprovada, a execução de atividades compatíveis com a atuação de SPSAVs até a Data de Início de Vigência devem solicitar autorização para funcionamento em até 260 dias contados da referida data.

          Nosso grupo de Serviços Financeiros está à disposição para esclarecimentos a respeito das Novas Regras.


          1. Artigo 3º da Lei nº 14.478, de 21 de dezembro de 2022.

          2. Além das atividades mencionadas acima, as intermediárias de ativos virtuais podem atuar, observada a regulamentação específica (inclusive as respectivas regras de autorização), como: (i) emissoras de moeda eletrônica; (ii) provedoras de liquidez do mercado de ativos virtuais; (iii) formadoras de mercado de ativos virtuais; (iv) prestadoras de serviços financeiros, em sistemas de registro distribuído ou similares, em serviços (a) para emissoras na estruturação de ofertas de ativos virtuais, e (b) de aconselhamento financeiro, incluindo análise de benefícios e riscos envolvidos na negociação de ativos virtuais que a intermediária de ativos virtuais não ofereça.

          3. Resolução Conjunta nº 14 e Resolução BCB nº 517, ambas de 3 de novembro de 2025.

          4. Ainda, encontra-se sob tramitação no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 4.932/2023, que dispõe, dentre outros temas, sobre a segregação patrimonial entre prestadores de serviços de ativos virtuais e seus usuários.

          Este boletim apresenta um resumo de alterações legislativas ou decisões judiciais e administrativas no Brasil. Destina-se aos clientes e integrantes do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados. Este boletim não tem por objetivo prover aconselhamento legal sobre as matérias aqui tratadas e não deve ser interpretado como tal.

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