O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) publicou, em 3/9/2025, a versão atualizada do Guia de Leniência Antitruste, documento que detalha procedimentos e boas práticas para negociação de acordos de leniência em casos de cartel e outras condutas anticoncorrenciais.
Trata-se de documento importante, embora não tenha caráter normativo, uma vez que organiza a aplicação prática da Lei nº 12.529/2011 e do Regimento Interno (RICADE) no que se refere a acordos de leniência. O documento está estruturado em cinco partes: aspectos gerais do programa, fases da negociação (incluindo a fase prévia e o pedido de marker), etapas posteriores à assinatura, regras da chamada Leniência Plus e diretrizes para cartéis internacionais.
Antes da reformulação do Guia, os acordos de leniência se limitavam a cartéis tradicionais. Com o novo guia, o alcance foi ampliado para incluir também condutas anticoncorrenciais envolvendo o mercado de trabalho, como fixação de salários (wage-fixing) e não contratação (no-poach), e cartéis de compra e condutas de troca de informações sensíveis.
Principais Novidades:
O documento traz avanços relevantes. Destacam-se:
- Leniência Plus: passa a ter faixas claras de desconto, podendo reduzir as multas em até 53,33% quando combinada com um Termo de Compromisso de Cessação (TCC). O CADE também criou a figura da “Leniência Plus condicional”, que permite antecipar benefícios em negociações de TCC, desde que o novo acordo seja efetivamente celebrado.
- Limites da Leniência Plus: O benefício da Leniência Plussó vale quando a conduta é nova. Assim, se a empresa já celebrou leniência em um mercado e depois passou a ser investigada em outro, não terá direito à Leniência Plus.
- Pedido hipotético de marker: Nesse modelo, o interessado pode apresentar informações preliminares — como setor, escopo geográfico, duração da conduta e uma lista das provas que pretende entregar — sem revelar sua identidade. Caso a Superintendência-Geral entenda que o material listado atende aos requisitos, o proponente deverá apresentar as evidências na íntegra. Diferentemente do procedimento tradicional, não há concessão de marker, mas o sigilo das informações prestadas é garantido¹1.
- Negociação do acordo de forma oral nos casos nacionais e internacionais: o Guia reitera que os proponentes poderão prestar depoimentos orais à SG/CADE, fornecendo informações detalhadas e documentos a respeito da prática denunciada, que subsidiarão a elaboração do documento denominado Histórico da Conduta.
- Confidencialidade e internacionalização: o Guia reforça a vedação de compartilhamento direto de informações a terceiros ou autoridades estrangeiras, exigindo waiver específico para cooperação internacional. Também prevê coordenação no momento de divulgação pública de investigações conjuntas.
- Cadeia de custódia: há um reforço das orientações técnicas detalhadas para documentos eletrônicos, incluindo métodos de extração, análise forense, preservação de discos rígidos e números hash.
- Cronograma: A SG/CADE disponibilizará, em conjunto com o termo de marker, um cronograma no qual constarão os prazos esperados, incluindo uma estimativa da duração da fase de negociação.
- Assinatura digital do acordo: possibilidade de assinatura por certificado digital ou meio eletrônico para pessoas físicas estrangeiras.
- Cooperação entre órgãos públicos: o guia prevê a possibilidade de atuação conjunta com a Controladoria-Geral da União e a Advocacia-Geral da União em casos de cartéis em licitações públicas, visando otimizar esforços investigativos e reduzir custos de colaboração.
Com a atualização, o CADE busca tornar o programa de leniência mais atrativo, transparente e previsível, fortalecendo sua eficácia como instrumento de combate a cartéis e outras práticas anticoncorrenciais. A expectativa é de que as novas regras ampliem a participação de empresas e indivíduos, incentivando a colaboração ativa com as autoridades e garantindo maior segurança jurídica aos signatários.
- Se as provas apresentadas não atenderem aos requisitos para um acordo de leniência, a Superintendência-Geral do Cade pode, a pedido do proponente, emitir uma “Carta Conforto”, documento semelhante ao Termo de Rejeição. Ainda assim, o órgão pode instaurar investigação própria para apurar a conduta denunciada, desde que haja indícios ou provas autônomas, conforme prevê o artigo 206, § 4º, do RICADE. ↩︎