CADE firma nova tese sobre dosimetria por prática de gun jumping

No caso, o APAC fora instaurado em novembro de 2019 pela Superintendência-Geral do CADE (SG), para investigar transferências de concessionárias de veículos. Em setembro de 2023, o Tribunal do CADE concluiu, por unanimidade, que uma operação entre a Govesa Motors Veículos e a Kurumá Veículos preenchia os requisitos legais de ato de concentração de notificação obrigatória, razão pela qual estaria sujeita à análise prévia da autarquia não obstante já tivesse sido consumada.

As partes submeteram a operação voluntariamente e obtiveram a aprovação sem restrições, dada a ausência de preocupações concorrenciais. Na 228ª SOJ, realizada no dia 17 de abril de 2024, o Conselheiro-Relator Gustavo Augusto Freitas de Lima fixou em seu voto a multa a ser imposta às empresas pela prática de gun jumping, ou seja, por terem consumado a operação antes da aprovação do CADE. No entanto, o julgamento foi suspenso em razão de pedido de vista do Conselheiro José Levi, com o fim de analisar questões referentes à proporcionalidade e razoabilidade da alíquota da multa a ser aplicada ao caso, considerando suas particularidades (tais como o valor relativamente baixo da operação analisada).

Na 229ª SOJ, no primeiro voto em conjunto da história do Tribunal do CADE, os Conselheiros José Levi e Diogo Thomson fixaram parâmetros objetivos para a intepretação do art. 22 da Resolução 24/2019[1], o qual estabelece exceção à aplicação dos critérios de dosimetria padrão para as condenações em APAC. Em suma, os Conselheiros sugeriram, como medida de proporcionalidade, e em analogia ao art. 37, I, da Lei de Defesa da Concorrência[2], que as multas decorrentes da prática de gun jumping deverão respeitar o limite de 20% do valor atualizado da operação.

Ressaltaram, ainda, que tal parâmetro não deverá ser aplicado (i) se verificada conduta dolosa das partes em não submeter ao CADE atos de concentração de notificação obrigatória, (ii) em operações com valores irrisórios (como o caso de certos contratos associativos) e/ou (iii) quando houver dano desproporcional ao mercado ocasionado pela operação.

Com base na nova orientação aplicada ao caso em análise, foram homologadas, por unanimidade, propostas de acordos individuais e específicas apresentadas pelas empresas.

Trata-se de importante precedente de aplicação de penalidade que servirá como diretriz para análise de casos futuros pela autarquia. O Cescon Barrieu Advogados teve protagonismo na condução desse caso emblemático perante o Tribunal do CADE que resultou não apenas na celebração de acordo mas no surgimento de nova tese para endereçar situações de dosimetria desproporcional eventualmente acarretadas pela aplicação literal da Resolução 24/2019.

[1] Art. 22. Em casos excepcionais, devidamente justificados, o Tribunal Administrativo do Cade poderá não aplicar os critérios previstos no art. 21 desta Resolução, observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e respeitados os limites estabelecidos no art. 20.

[2] Art. 37.  A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas: I – no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação. 

Este boletim apresenta um resumo de alterações legislativas ou decisões judiciais e administrativas no Brasil. Destina-se aos clientes e integrantes do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados. Este boletim não tem por objetivo prover aconselhamento legal sobre as matérias aqui tratadas e não deve ser interpretado como tal.

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