A Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) divulgou, nesta quinta-feira (03.07), as Resoluções CVM nº 231 e 232, que regulam o regime de Facilitação do Acesso a Capital e de Incentivo a Listagens (“Resolução CVM 231” “Resolução CVM 232” e “FÁCIL”, respectivamente).
O FÁCIL atribui às Companhias de Menor Porte (conforme indicadas no item 1 abaixo) (“CMP”) determinadas dispensas regulatórias, criando requisitos proporcionais ao seu porte, bem como possibilitando maior facilidade de acesso ao mercado de valores mobiliários a partir da redução de custos e da aderência às novas modalidades de oferta pública instituídas pela CVM para essas companhias.
O novo arcabouço regulatório para CMPs confere protagonismo à supervisão exercida pelas entidades administradoras de mercados organizados, complementando o esforço de supervisão realizado pela CVM. Também confere flexibilidades na escolha de diferentes modalidades de ofertas públicas de valores mobiliários simplificadas (comparadas em formato de tabela abaixo neste Informa), além de um regime fluido de utilização de dispensas regulatórias pelas CMPs.
Como se verá mais detalhadamente a seguir, as principais novidades direcionadas às CMP são:
- substituição do formulário de referência, do prospecto e da lâmina por um único formulário com mens exigências informacionais (Formulário FÁCIL), apresentado anualmente ou por ocasião de ofertas públicas;
- divulgação de informações contábeis auditadas em períodos semestrais, em substituição às informações trimestrais;
- realização de oferta de valores mobiliários de até R$300 milhões sob regime de “oferta direta”, realizada em ambiente da entidade administradora de mercado organizado, com dispensa de registro na CVM e de contratação de um coordenador líder;
- realização de ofertas de valores mobiliários representativos de dívida voltadas exclusivamente a investidores profissionais independentemente de contratação de um coordenador líder para a oferta e de auditoria em demonstrações financeiras;
- obtenção do cancelamento de registro mediante oferta pública de aquisição de ações (OPA) com quórum de sucesso equivalente à metade das ações em circulação, em substituição aos atuais 2/3 das ações em circulação previstos na Resolução CVM nº 85, de 31 de março de 2022, conforme alterada (“Resolução CVM 85”).
1. Classificação – Companhia de Menor Porte (CMP)
Para que uma companhia seja classificada como CMP, ela deve:
- ter receita bruta anual inferior a R$500MM;
- estar listada no mercado organizado de valores mobiliários;
- encontrar-se em estágio operacional; e
- obter anuência prévia dos titulares de valores mobiliários em circulação, no caso de ser emissor já registrado perante a CVM.
A classificação enquanto CMP não se confunde com a distinção de categorias de registro de emissores de valores mobiliários (categoria A e categoria B) atualmente existente na Resolução CVM nº 80, de 29 de março de 2022, conforme alterada (“Resolução CVM 80”). Assim, os emissores registrados na CVM continuarão segmentados em categorias A e B, podendo, adicionalmente, ser classificados como CMP.
Perda da Classificação
O emissor pode deixar de ser classificado como CMP nas seguintes hipóteses:
- requerimento do próprio emissor;
- superação do limite de R$ 500 MM de receita bruta anual1;
- des listagem de mercado organizado; e/ou
- não realização de oferta pública de distribuição de valores mobiliários nos 24 meses seguintes à sua classificação como CMP, quando obtida concomitantemente com o registro de emissor.
As CMPs registradas como companhias abertas categoria B que superarem o limite da receita bruta estipulado para fins de enquadramento como CMP poderão manter a sua classificação como CMP até a data de vencimento dos valores mobiliários de sua emissão já ofertados publicamente, desde que não sejam realizadas novas ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários.
Nos demais casos, a perda da classificação como CMP produz efeitos:
- No caso de superação do limite de receita: em 1 ano, a contar da notificação da administradora de mercado organizado, informando sobre a perda do requisito da receita bruta limite;
- Nas hipóteses de não preenchimento dos demais requisitos: em 90 dias, a contar da notificação da administradora de mercado organizando, informando sobre a perda de requisito para caracterização como CMP, exceto o requisito da receita bruta.
Durante os prazos mencionados acima, não será permitida a realização de novas ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários com as dispensas aplicáveis às CMPs, exceto nos casos em que os esforços para a realização da oferta pública já tenham sido iniciados e possam ser comprovadamente verificados.
A perda da classificação como CMP implica o restabelecimento integral do cumprimento das obrigações regulatórias aplicáveis às demais companhias abertas.
Cancelamento de Registro CVM
Assim como ocorre para as companhias abertas, o mecanismo necessário para o cancelamento de registro das CMP é a realização de OPA. Contudo, a norma apresenta algumas flexibilizações para a OPA de cancelamento de registro:
- Aprovação por metade das ações em circulação, conforme já antecipado neste Informa;
- Dispensa de contratação de instituição financeira responsável pela garantia da liquidação da OPA, caso a entidade administradora de mercado organizado assuma esse papel; e
- Possibilidade de o laudo de avaliação ser produzido por avaliadores credenciados pela administradora de mercado organizado.
2. Regime Informacional – CMP
Relação de Dispensa de Obrigações Regulatórias
Para que as CMPs usufruam das dispensas regulatórias inauguradas pelo FÁCIL, é necessário que seja elaborado um Relatório de Dispensa de Obrigações Regulatórias, indicando expressamente quais são as dispensas que a companhia deseja usufruir. Tal documento só poderá ser modificado uma única vez a cada exercício social.
As obrigações incluídas nos Relatório de Dispensa de Obrigações Regulatórias das Companhias não poderão ser cumpridas em caráter voluntário pelas CMPs.
Documentos de Ofertas Públicas
A norma promove a simplificação das obrigações informacionais exigidas nas ofertas públicas de valores mobiliários quando o emissor for uma CMP, especialmente com a possibilidade de substituição do formulário de referência, do prospecto e da lâmina pelo formulário FÁCIL (documento mais sintético, que consolida todas as informações relevantes das companhias e cujo conteúdo está disponível no Anexo B da Resolução CVM 232).
Informações Financeiras
A divulgação de informações contábeis do emissor classificado como CMP ocorre em periodicidade semestral, e não trimestral, como é atualmente a regra geral de companhias abertas.
Por outro lado, as companhias classificadas como CMP deverão enviar à CVM relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, desde que esse documento não esteja listado em seu Relatório de Dispensa de Obrigações Regulatórias.
Dispensas Adicionais
O FÁCIL ainda dispensa as CMPs das seguintes obrigações informacionais junto à CVM:
- envio de informe sobre o Código de Governança Corporativa;
- envio de reporte mensal de titularidade e negociação de valores mobiliários por parte dos administradores e membros do conselho fiscal do emissor, desde que tal obrigação esteja indicada em seu Relatório de Dispensa de Obrigações Regulatórias;
- elaboração e envio de política de negociação de valores mobiliários e de ato ou fato relevante, desde que tal obrigação esteja indicada em seu Relatório de Dispensa de Obrigações Regulatórias;
- manter informações em sua página na rede mundial de computadores; e
- envio de boletim de a distância e mapas de votação, desde que tal obrigação esteja indicada em seu Relatório de Dispensa de Obrigações Regulatórias.
3. Modalidades de Oferta Pública
O FÁCIL apresenta 3 modalidades de ofertas públicas disponíveis às companhias de menor porte registradas na CVM, além de prever uma nova modalidade de oferta voltada para as ofertas de dívidas de emissores não registrados destinadas exclusivamente a investidores profissionais.
As principais características de cada uma das modalidades de oferta pública estão apresentadas na tabela abaixo:
Oferta Pública Tradicional (Resolução CVM 160) | Ofertas de ações ou dívida para público em geral (parte das Resoluções CVM 160 e 161) | Oferta de dívida para investidores profissionais (parte das Resoluções CVM 160 e 161) | Oferta Direta | |
Registro da oferta na CVM | Sim | Sim | Sim | Não |
Registro do emissor na CVM | Sim, observada a possibilidade de registro automático para CMPs | Sim, observada a possibilidade de registro automático para CMPs | Não obrigatório, devendo apenas possuir receita bruta anual até R$ 500MM | Sim, observada a possibilidade de registro automático para CMPs |
Documentos obrigatórios: | Todos aqueles indicados na Resolução CVM 160, incluindo formulário de referência, informações trimestrais, prospecto e lâmina | Formulário FÁCIL | Todos os documentos indicados no art. 89 da Resolução CVM 160 | Formulário FÁCIL |
Limite do valor da oferta: | N/A | R$300.000.000,00 (a cada 12 meses) | R$300.000.000,00 (a cada 12 meses) | R$300.000.000,00 (a cada 12 meses) |
Necessária atuação de coordenador líder | Sim | Sim | Não, mas o ofertante assume algumas das obrigações regulatórias dos coordenadores | Não |
Observações | N/A | Ficam vedadas: (i) distribuição de lote suplementar; e (ii) distribuição a pessoas vinculadas | Nas ofertas de emissores não registrados na CVM, as demonstrações financeiras do emissor não precisarão ser auditadas, desde que os investidores firmem termo de ciência específico Vedada a participação de (i) RPPS, (ii) EFPCs e (iii) fundos de investimento cujos recursos provenham predominantemente de RPPS ou EFPC | A oferta ocorrerá no âmbito de procedimento especial (vide detalhamento a seguir). |
As Ofertas Diretas ocorrerão por meio de procedimento especial, com destaque para as seguintes particularidades:
- O formulário eletrônico de que trata a Resolução CVM 160 deve ser preenchido pelo depositário central, no qual estão depositados os valores mobiliários negociados;
- No caso da oferta direta, não se aplicam às regras previstas na Resolução CVM 160, exceto se assim previsto;
- Serão coletadas ofertas de compra transmitidas por intermediários em nome dos investidores e que determinarão a alocação dos valores mobiliários na oferta;
- Preservação dos seguintes elementos: (i) limitação da discricionariedade na alocação dos valores mobiliários; (ii) vedação à participação de pessoas vinculadas na oferta; (iii) disseminação uniforme de informações sobre a demanda pelos valores mobiliários ofertados; e (iv) possibilidade de investidores revogarem suas compras com até 24 horas antes do término do procedimento especial;
- A oferta pode ser cancelada até o momento de encerramento do procedimento especial;
- A documentação da Oferta será objeto de análise prévia da entidade administradora de mercado organizado;
- A página da entidade administradora deverá apresentar as seguintes informações sobre a oferta: (i) o formulário FÁCIL, (ii) documentos de suporte a apresentações a investidores que venham a ser utilizados; (iii) indicações das eventuais alterações pelas quais os documentos antes mencionados tenham passado; e (iv) a data do procedimento especial;
- Encerrada a oferta, a página da entidade administradora deverá apresentar as seguintes informações: (i) o sucesso ou insucesso da oferta; (ii) preço ou taxa; (iii) montante captado; e (iv) número de investidores participantes, dentre outros; e
- Caberá à entidade administradora do mercado organizado estabelecer as regras operacionais do procedimento especial.
4. Outras Flexibilizações Relevantes
- Preço de OPA. CMPs estão vinculadas ao preço de uma OPA no presente para o preço de uma eventual OPA no futuro por apenas 6 meses, em vez de 1 ano, que é a regra geral disposta na RCVM 85;
- Dividendos. CMPs estão dispensadas de distribuir dividendos obrigatórios, na forma prevista no artigo 294-A da Lei das Sociedades por Ações;
- Escrituração. CMPs podem ter entidades administradoras de mercado organizado como escrituradoras dos valores mobiliários de sua emissão.
Acesse aqui a íntegra do material disponibilizado pela CVM sobre o regime FÁCIL.
1. As demonstrações financeiras analisadas para fins de checagem do requisito acima levam em conta as demonstrações financeiras já aprovadas pelos acionistas em sede de assembleia geral. Desse modo, ainda que uma companhia, ao longo do exercício social, já tenha excedido o limite de R$500MM de receita bruta, esta continuará enquadrada como CMP até que as novas demonstrações financeiras reconhecendo o atingimento do limite sejam aprovadas via assembleia geral ordinária.