O Relatório foi produzido a partir da análise de exemplos internacionais, como o Digital Market Act (DMA) da União Europeia, bem como das contribuições enviadas pela sociedade civil e por autoridades à Tomada de Subsídios sobre o tema, que ocorreu entre janeiro e maio deste ano.
O Relatório apresenta as conclusões do Ministério da Fazenda e aponta existir atualmente um descompasso entre os mecanismos atuais de promoção da concorrência e as novas dinâmicas dos mercados digitais, destacando que as ferramentas disponíveis na legislação atual, especialmente na Lei de Defesa da Concorrência (Lei 12.529/2011), não são adequadas para enfrentar os desafios trazidos pela evolução do ambiente digital.
Diante disso, o Relatório propõe uma abordagem regulatória híbrida que combina dois grupos de medidas de aperfeiçoamento ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência: (i) o primeiro grupo sugere reformas na Lei de Defesa da Concorrência, com a introdução de novos instrumentos pró-competitivos direcionados a plataformas sistemicamente relevantes (definidas, pelo Relatório, como “agentes de grande porte que controlam ecossistemas complexos com efeitos de rede acentuados“), e no desenho institucional necessário para implementá-los; e (ii) o segundo grupo propõe a atualização da aplicação da Lei de Defesa da Concorrência com adaptação dos instrumentos e procedimentos de análise de condutas e atos de concentração para a realidade dos mercados digitais.
Abaixo a síntese das medidas propostas:
Grupo 1 – Novo instrumento para a promoção da concorrência em casos de plataformas com relevância sistêmica
1. Estabelecer um procedimento para designar plataformas de relevância sistêmica com base em critérios qualitativos e quantitativos, como mercados de múltiplos lados, efeitos de rede e limites de receita;
2. Introduzir obrigações procedimentais e de transparência para plataformas designadas, incluindo notificações prévias de fusões e transparência nos serviços e termos de uso;
3. Permitir que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) investigue plataformas designadas e imponha obrigações substantivas específicas para abordar questões de concorrência;
4. Criar uma unidade especializada dentro do CADE para implementar e monitorar o novo instrumento pró-concorrência para plataformas designadas;
5. Implementar obrigações substantivas em colaboração com reguladores como Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) para tratar de questões técnicas e específicas do setor;
6. Fortalecer as capacidades do CADE para conduzir estudos de mercado, concedendo poder de análise proativa ao Departamento de Estudos Econômicos;
7. Criar um fórum de cooperação interinstitucional entre o CADE e outros órgãos federais para facilitar o intercâmbio de informações e a colaboração em questões de mercados digitais.
Grupo 2 – Ajustes na Aplicação de Ferramentas Antitruste para Plataformas em Geral
8. Atualizar as ferramentas de análise antitruste para incorporar análises de redes e ecossistemas para avaliar riscos competitivos em plataformas digitais;
9. Revisar o formulário de notificação de fusões do CADE para incluir questões específicas sobre dinâmicas de mercado digital, como efeitos de rede e uso de dados;
10. Adotar o processo ordinário para a análise de fusões envolvendo plataformas digitais com um grande número de usuários, permitindo uma análise mais profunda;
11. Utilizar a flexibilidade da Lei 12.529/2011 para exigir a submissão de fusões que apresentem riscos competitivos, mesmo que não atendam aos critérios de notificação formal;
12. Atualizar os limites de receita para notificações prévias de fusões, permitindo que o CADE concentre seus recursos em transações com maior impacto competitivo.
Com o Relatório, o Ministério da Fazenda buscou aprofundar o entendimento sobre os aspectos econômicos e concorrenciais das plataformas digitais no Brasil. As propostas passarão por análise adicional após serem apresentadas ao Congresso Nacional. Espera-se que as discussões continuem e sejam encerradas nos próximos meses com o encaminhamento ao Poder Legislativo.
O CADE publicou nota oficial manifestando sua concordância com as propostas apresentadas no Relatório e reforçando sua contribuição à Tomada de Subsídios. Destacou a atual necessidade de uma regulação ex ante, em complemento à Lei de Defesa da Concorrência, sendo essencial enfrentar as questões estruturais dos mercados digitais. Além disso, também enfatizou a necessidade de criação de uma unidade especializada em mercados digitais no CADE, permitindo uma atuação mais direcionada e eficiente para esses mercados.
O Cescon Barrieu conta com um time especializado em Concorrencial e Tecnologia & Inovação e está à disposição para esclarecer dúvidas e fornecer orientações adicionais sobre a matéria.