Na última quinta-feira (12/12/2024), o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei Complementar n.° 68/2024 (“PLP”), que regulamenta a reforma tributária do consumo, aprovada pela Emenda Constitucional n.° 132/2023.
O texto foi aprovado após algumas alterações em relação ao projeto aprovado em julho deste ano pela Câmara dos Deputados.
A seguir apresentamos as principais alterações do texto final submetido ao Senado Federal, em comparação com aquele aprovado pela Câmara do Deputados:
Fato Gerador
- Incidência do IBS e da CBS em operações com ativo não circulante ou no exercício de atividade econômica não habitual;
- Incidência de IBS e CBS sobre o pagamento de obrigação legal ou determinação judicial para remunerar fornecimento, ressalvados honorários de sucumbência.
Bens e serviços de uso ou consumo pessoal
- Incidência do IBS e da CBS no fornecimento de bens e serviços de uso ou consumo pessoal a sócios, diretores, empregados etc., que constava no texto aprovado na Câmara dos Deputados, passou a ser a exceção – Texto ajusta hipóteses de vedação ao crédito (vide abaixo).
Não Contribuintes
Não são contribuintes do IBS e da CBS:
- Transportador autônomo de carga;
- Fundos patrimoniais instituídos pela Lei n.º 13.800/2019;
- Os consórcios empresariais, nos termos da Lei das S/A.
Momento de ocorrência do fato gerador
- Exclusão do pagamento como momento da ocorrência do fato gerador (permaneceu apenas o fornecimento);
- Pagamento anterior ao fornecimento acarretará a mera antecipação do recolhimento, que seguirá a legislação vigente e sofrerá ajuste quando do efetivo fornecimento (inclusive no tocante às alíquotas vigentes) – Novo sistema mistura regimes de caixa e de competência;
- Em caso de pagamento antecipado dos tributos sem efetivo fornecimento posterior do bem ou serviço, tributos antecipados constituirão créditos compensáveis pelo contribuinte;
- Pagamento permaneceu como critério de identificação da ocorrência do fato gerador nas seguintes hipóteses:
- aquisições de bens e serviços pela administração pública direta, por autarquias e por fundações públicas;
- operações de execução continuada ou fracionada em que não seja possível identificar o momento de entrega ou disponibilização do bem ou do término do fornecimento do serviço, como as relativas a abastecimento de água, saneamento básico, gás canalizado, serviços de telecomunicação, serviços de internet e energia elétrica.
Local da operação
- Inclusão dos serviços de administração e intermediação de bem imóvel nas hipóteses em que o local da operação será onde o imóvel estiver situado;
- No caso de serviços não arrolados no art. 11 e demais bens móveis imateriais, incluindo cessão de direitos, o local da operação deixa de ser o domicílio principal do destinatário e passa a ser o domicílio principal do:
- adquirente, nas operações onerosas;
- destinatário, nas operações não onerosas.
- Aquisições de energia elétrica realizadas de forma multilateral: local da operação será o do estabelecimento ou domicílio do agente que figure com balanço energético devedor;
- Operações de transporte dutoviário de gás natural: o local da operação será o do estabelecimento principal do (a) fornecedor, na contratação de capacidade de entrada de gás natural do duto; e (b) adquirente, na contratação de capacidade de saída do gás natural do duto;
- Operações de cessão de espaço para prestação de serviços publicitários: domicílio principal do adquirente.
Sujeição Passiva
- Responsabilização de adquirente na aquisição de bem apreendido ou abandonado via licitação promovida pelo poder público ou leilão judicial;
- Responsabilização das plataformas digitais em relação ao IBS e CBS incidente sobre as importações: plataforma também será solidária com adquirente ou destinatário em caso de fornecedor domiciliado no exterior;
- Responsabilidade de desenvolvedores ou fornecedores de programas ou aplicativos utilizados para registro de operações com bens ou com serviços: PLP passou a exigir que tais programas contenham funções ou comandos inseridos com a finalidade de descumprir a legislação tributária para a extensão da responsabilidade (ou seja, exigência de dolo do fornecedor).
Substituição Tributária
- O Comitê Gestor do IBS e a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, por meio de ato conjunto, poderão estabelecer regime de substituição tributária em relação ao IBS e à CBS incidentes em operações subsequentes, a partir de 2029;
- Regime poderá ser aplicado a bebidas alcoólicas, águas minerais, refrigerantes, cigarros e outros derivados do fumo;
- O ato conjunto poderá restringir a aplicação do regime de substituição tributária às operações destinadas a contribuinte do setor de varejo, bem como definir as hipóteses de inaplicabilidade do referido regime;
- A base de cálculo será o preço final ao consumidor fixado por órgão público competente;
- Caso o preço final não seja fixado por órgão público, a base de cálculo será:
- O preço praticado pelo fornecedor, acrescido de frete, seguro, tributos que integram a base de cálculo do IBS e da CBS, outros encargos cobrados do adquirente, e a parcela resultante da aplicação do percentual de margem de valor agregado (MVA) para operações subsequentes; ou
- O preço médio ponderado a consumidor final (PMPF), divulgado em ato conjunto do Comitê Gestor do IBS e da Receita Federal.
- O ato conjunto disciplinará as metodologias de apuração da MVA e do PMPF, a serem estabelecidas com base em preços usualmente praticados no mercado considerado;
- O fornecedor que realizar operação destinada a contribuinte com os produtos submetidos ao regime de substituição tributária será responsável pelo recolhimento do IBS e da CBS incidentes na operação;
- Vedada a apropriação de crédito do IBS e da CBS pelo contribuinte substituído nas aquisições de produtos sujeitos ao regime de substituição tributária, com exceção do exportador.
Base de cálculo
- A COSIP não integrará a base de cálculo do IBS e da CBS;
- No transporte internacional de passageiros, caso os trechos de ida e volta sejam vendidos em conjunto, a base de cálculo será a metade do valor cobrado.
Não Cumulatividade
-
Crédito não ficará condicionado ao pagamento em caso de não implementação do split payment e do pagamento pelo adquirente;
- Alterações nos critérios quanto aos itens que poderão ou não ser creditados:
- Regra geral continua sendo a permissão do crédito nas aquisições de bens, serviços e direitos pelo contribuinte (não cumulatividade ampla);
- Manutenção da lista anterior de itens vedados (joias, armas, bebidas alcoólicas etc.), a não ser que sejam utilizados nas atividades do contribuinte (quando darão direito a crédito);
- Extensão da vedação ao crédito para bens e serviços adquiridos ou produzidos pelo contribuinte e fornecidos de forma não onerosa ou a valor inferior ao de mercado a sócios, acionistas, administradores, membros de conselhos de administração e fiscal e comitês de assessoramento do conselho de administração do contribuinte e empregados, inclusive a cônjuges, companheiros ou parentes, consanguíneos ou afins, até o terceiro grau dessas pessoas. O fornecimento não oneroso desses itens, na versão do PLP aprovada na Câmara, seria tributado; agora, ao invés de tributado, não mais permitirá o crédito nas aquisições correspondentes.
- A aquisição dos seguintes itens não ensejará o direito ao crédito, sem prejuízo de outros (lista exemplificativa):
-
- Bem imóvel residencial e os demais bens e serviços relacionados à sua aquisição e manutenção;
- veículo e os demais bens e serviços relacionados à sua aquisição e manutenção, inclusive seguro e combustível;
- Bens e serviços que tenham sido fornecidos por sociedade que tenha por atividade principal a gestão de patrimônio e dos ativos financeiros dessas pessoas físicas (Family office).
- PLP garante o aproveitamento de créditos de IBS e CBS sobre os seguintes itens, ainda que fornecidos gratuitamente às pessoas físicas indicadas acima:
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- Bens e serviços que sejam preponderantemente utilizados nas atividades dos contribuintes;
- Alimentação e bebida não alcoólica disponibilizada no estabelecimento do contribuinte para seus empregados e administradores durante a jornada de trabalho;
- Serviços de creche disponibilizados no estabelecimento do contribuinte para seus empregados e administradores durante a jornada de trabalho;
- Benefícios educacionais a seus empregados e dependentes em decorrência de acordo ou convenção coletiva de trabalho, inclusive mediante concessão de bolsas de estudo ou de descontos na contraprestação.
- Não são considerados “bens de uso e consumo pessoal” os itens utilizados no desenvolvimento de atividade econômica por pessoa física caracterizada como contribuinte do regime regular.
Bens de Capital
- PLP deixa mais claro o direito ao crédito integral e imediato na aquisição de bens de capital.
Alíquotas
- Com as mudanças, a estimativa é a de que a alíquota padrão global parta de 27,97% para 28,6%. Essa estimativa ainda deverá ser confirmada;
-
A versão do PLP aprovada na Câmara dos Deputados já previa o encaminhamento de projeto de lei complementar com proposta de diminuição dos regimes diferenciados (itens sujeitos a reduções de 30% e 60%) caso a soma das alíquotas de referência (IBS e CBS) resultasse em percentual superior a 26,5%;
- No novo texto, a determinação é mais enfática, já que o PLP passou a prever (a) a apresentação do projeto no prazo de 90 (noventa) dias após a conclusão da avaliação quinquenal; (2) a exigência de apresentação dos dados e dos cálculos que basearam a sua apresentação; e (3) a alteração do escopo e da forma de aplicação dos regimes e das políticas relacionadas
Split Payment
- Extensão do split payment a todos os prestadores de serviços de pagamento eletrônico, instituições operadoras de sistemas de pagamentos, participantes de arranjos de pagamento, abertos e fechados, públicos e privados, inclusive os participantes e arranjos que não estão sujeitos à regulação do Banco Central do Brasil;
- Previsão das plataformas digitais de também fornecer informações das transações aos prestadores de serviços de pagamento, em relação às operações e importações realizadas por seu intermédio;
- Procedimento simplificado (com percentuais fixos) poderá ser aplicado enquanto o split payment regular ainda não puder ser implementado.
Exportações
- Ampliadas as hipóteses de bens e serviços que receberão o tratamento de exportação (sem incidência de IBS e CBS), sendo eles:
- Intermediação na distribuição de mercadorias no exterior (comissão de agente);
- Seguro, manuseio, pesagem, medição e refrigeração de carga;
- Despacho aduaneiro;
- Armazenagem de mercadorias;
- Transportes rodoviário, ferroviário, aéreo, aquaviário ou multimodal de cargas;
- Manuseio de contêineres;
- Unitização e desunitização de cargas;
- Agenciamento de transporte de cargas;
- Remessas expressas;
- Arrendamento mercantil operacional ou locação de contêiners;
- Instalação e montagem de mercadorias exportadas.
- Suspensão do IBS e da CBS no fornecimento de produtos agropecuários in natura para contribuinte do regime regular que promova industrialização destinada a exportação para o exterior, desde que cumpridos alguns requisitos previstos no PLP;
- Equiparação a exportação do fornecimento de combustível ou lubrificante de aeronaves em tráfego internacional com destino ao exterior.
Plataformas Digitais
- Não será considerada plataforma digital aquela que executa somente os serviços de pagamentos prestados por instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil;
- Se o pagamento for iniciado pela plataforma digital, ela deve fornecer informações para a segregação e recolhimento dos valores do IBS e CBS do fornecedor na liquidação financeira (split payment), inclusive no procedimento simplificado;
- A plataforma digital não será responsável por eventuais diferenças nos valores de IBS e CBS recolhidos, desde que cumpra as obrigações da Lei Complementar;
- Se o fornecedor for residente ou domiciliado no Brasil e o pagamento não for iniciado pela plataforma digital, ela não será responsável tributária, desde que forneça as informações exigidas e o fornecedor emita documento fiscal eletrônico;
- A plataforma não será responsável tributária se o pagamento for iniciado pela plataforma digital, mas não for realizado o split payment;
- Se a plataforma for responsável tributária, ela será solidariamente responsável pelos débitos de IBS e CBS do fornecedor, caso ele seja residente no Brasil e estiver inscrito como contribuinte, nos regimes regular ou favorecido;
- A plataforma digital não será responsável tributária nas operações em que não controle os elementos essenciais;
- A plataforma pode optar, com anuência do fornecedor, por emitir documentos fiscais eletrônicos em nome do fornecedor, inclusive de forma consolidada; ou pagar o IBS e CBS, com base no valor e nas informações da operação intermediada, mantendo a obrigação do fornecedor para eventuais diferenças.
Cashback
- Inclusão dos serviços de telecomunicação na devolução mínima de 100% de CBS e 20% de CBS;
- Previsão de devolução do IBS e da CBS concomitantemente à cobrança do consumidor também para os serviços de telecomunicação.
Zonas de Processamento de Exportação – ZPE
- Texto deixou mais clara a possibilidade de prestadores de serviços aproveitarem os benefícios das ZPEs;
- Inclusão da suspensão de IBS e da CBS na energia elétrica utilizada como matéria-prima por prestadores de serviços instalados na ZPE, quando proveniente de fontes renováveis.
Energia Elétrica
- O recolhimento relativo à geração de energia elétrica será realizado exclusivamente:
- Pela Distribuidora, na venda para adquirente em ambiente de contratação regulado;
- Pela Alienante, quando a aquisição é realizada no ambiente de contratação livre de energia para consumo ou quando o adquirente não estiver sujeito ao regime regular do IBS e da CBS;
- Pelo Adquirente, quando a energia se destine para consumo na aquisição de energia elétrica realizada de forma multilateral;
- Pela Transmissora, quando o serviço for prestado ao consumidor conectado diretamente à rede básica de transmissão.
Zona Franca de Manaus – ZFM
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Exclusão de limitador de 2/3 com relação ao crédito presumido de IBS nas vendas de bens produzidos na ZFM por indústria incentivada para o restante do território nacional;
- Crédito presumido de 100% de IBS para todos os bens para os quais a legislação amazonense havia estabelecido crédito estímulo de 100% até 31 de dezembro de 2023 (antes abrangia apenas bens de informática);
- Crédito presumido de 6% de CBS foi ampliado para além dos produtos com alíquota zero de IPI;
- Produtos que em 31/12/2023 tinham alíquotas de IPI inferiores a 6,5%, e que passarão a ter alíquota zero em 2027, também terão direito a créditos presumidos de CBS (antes apenas os produtos com IPI superior a 6,5% teriam esse direito);
- Redução a zero do IPI para os produtos com alíquotas inferiores a 6,5% não alcança os bens de informática, que continuarão sendo tributados.
- Esclarecimentos quanto aos créditos presumidos de IBS e CBS no caso de industrialização por encomenda praticado entre empresas localizadas na ZFM e fora dela;
- Inclusão das indústrias de refino de petróleo localizadas na ZFM na possibilidade de usufruir os benefícios, exclusivamente em relação às saídas internas para a área incentivada, desde que cumprido o processo produtivo básico.
Imposto Seletivo
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Exclusão das bebidas açucaradas das hipóteses de incidência do Imposto Seletivo;
- Alíquota com transição escalonada para cigarros;
- Ajustes nos critérios para a formação das alíquotas sobre os automóveis.
Esses pontos alteram alguns dos tópicos mais relevantes do PLP 68/2024, que foram destacados em nossos Informas anteriores:
- Projeto de Lei da Reforma Tributária é aprovado pela Câmara dos Deputados
- GT da Câmara dos Deputados apresenta Substitutivo ao Projeto de Lei da Reforma Tributária
A equipe tributária do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto está à disposição para auxiliá-los quanto ao tema.